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Eurídice Zaituna Kala descontrói Nova Iorque em exposição em Paris

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A artista moçambicana Eurídice Zaituna Kala desconstrói a imagem de Nova Iorque e até do “sonho americano” numa exposição patente na Galeria Anne Barrault, em Paris. As fotografias montadas em estruturas de vidro e metal mostram ausências, desigualdades, relações de poder entre os homens e entre estes e a natureza. Eurídice Zaituna Kala mostra como a arquitectura é mais uma ferramenta de implementação de disparidades sociais e como a cidade vai tapando as camadas do seu próprio passado.

A exposição "En quelques gestes : as if two suns were setting", patente até 5 de Outubro, é constituída por obras realizadas durante uma residência em Nova Iorque e questiona o peso que a arquitectura urbana tem sobre a natureza e sobre as próprias pessoas.

“Quando propus um projecto de pesquisa para ir a Nova Iorque, era para olhar para a arquitectura. Para olhar como a arquitectura, de uma forma violenta, ocupa o espaço natural e cria uma sensação de betão (...) Eu queria desconstruir essa noção e, ao mesmo tempo, olhar para os arquivos: como é que a cidade foi ocupada na época pré-colonial, no pós-guerra, no pós-Segunda Guerra Mundial, que tipos de arquitectura chegaram. E como eu tenho, na materialidade do meu trabalho, materiais como o metal e o vidro, era claro que eu queria entrar também nessa noção de como esses materiais interagem com a cidade. Quais são as janelas que esses materiais criam? Quais são os ecrãs que eles criam? Como é que esses objectos obstruem a possibilidade de comunicar uns com os outros? Em Nova Iorque, tu passas em frente a um prédio e tens a sensação que não podes interagir com as pessoas que estão no interior. Quer dizer, a interioridade é completamente coberta, submersa, a partir desses materiais”, descreve a artista.

Continuando as suas pesquisas em torno dos arquivos, a artista moçambicana estudou as raízes da cidade, originalmente habitada pelo povo autóctone Lenapes e desenhada com várias colinas e rios, hoje substituídos por arranha-céus. “Havia uma natureza, uma fauna ou uma flora que esteve lá antes de uma colonização violenta que mudou completamente a topografia da cidade”, recorda. Por outro lado, ela interessou-se pela relação entre Nova Iorque e a água, um elemento que outrora dominava a paisagem e que passou a ser dominado pelas ambições arquitectónicas.

“Chegar a Nova Iorque e falar em água é quase impossível. Nós imaginamos sempre uma cidade de betão, tudo coberto, tudo numa submersão, socialmente falando, uma submersão humana, densa. Mas a história topográfica de Nova Iorque é completamente oposta a essas paisagens que nós temos do nosso imaginário. Nessa oposição, tem a água que foi coberta pela arquitectura num plano de urbanização do Robert Moses, que veio obstruir essas fontes de água que atravessavam Manhattan, Brooklyn, Bronx para criar espaços de construção”, acrescenta.

Eurídice Zaituna Kala também explorou o conceito da arquitectura contemporânea como “soft power”, em que os arranha-céus luxuosos olham de cima para os prédios sociais, os quais são reservados aos pobres e sujeitos à subida das águas durante as inundações.

“Isso foi também um dos contextos que me interessava muito compreender. Eu tive a oportunidade de subir ao andar 86 de uma torre e de viver essa experiência. Foi super estranho porque são espaços que são vendidos muito caros e que representam um contexto de arquitectura, mas, ao mesmo tempo, representam um contexto de consumo espacial, um contexto de movimento, de liquidez de espaço. Quis compreender o que quer dizer essa disparidade entre esses prédios que hoje em dia são vendidos muito caros e os prédios sociais porque Nova Iorque é uma cidade de prédios, sempre teve uma relação com a verticalidade. Os prédios sociais que foram construídos para as famílias menos ricas são também arranha-céus, mas criaram uma completa desconexão entre gerações de famílias que não puderam entrar em relação, que causaram questões sociais complexas, criminalidade, uso de drogas, etc, etc. Quer dizer, esses dois contextos propõem duas formas de criar sociedade”, continua.

Outra linha de força da exposição são as ausências, figuradas por vidros sem imagens ou pelo simbólico capuz vazio de uma camisola encontrada numa rua qualquer. Esta é também uma homenagem ao jovem negro assassinado Trayvon Martin, ao movimento Black Lives Matter e ao artista David Hammons.

Há, ainda, uma imagem criada por Inteligência Artificial que ilustra os próprios limites da tecnologia, ainda que crie uma nova camada que tende para a abstração pictórica e fotográfica. Eurídice Zaituna Kala recolheu textos inscritos em monumentos de Nova Iorque a prestarem homenagem ao povo autóctone que, outrora, viveu naquela zona e pediu à Inteligência Artificial para criar imagens. O resultado são duas imagens sobrepostas, em que se percebe uma paisagem verde luxuriante e vários espectros pálidos.

Na segunda sala, há fotografias em tons azulados que remetem, mais uma vez, para o universo da água, mas também para o imaginário cinematográfico de Nova Iorque. A artista conta-nos que se inspirou nos tons do filme “La Nuit Américaine” de François Truffaut para mostrar que a sensação de se estar numa "cidade que não dorme" pode ser esgotante e uma metáfora de que o “sonho americano” é impossível.

“Tem uma certa referência a “La Nuit Américaine”, que é este filtro usado no cinema que projecta uma sensação de noite, uma sensação de estar no exterior, de uma continuidade do dia. Eu acho que Nova Iorque tem essa forma de se querer projectar como algo que não acaba, como um dia que não acaba. Há também a questão do conceito americano que fala do sonho americano porque se o dia não acaba e se não podemos descansar, quer dizer que não temos tempo para sonhar! Ou seja, o fim desse sonho americano é mesmo uma consciência de como vivemos nestas cidades”, conclui.

É a primeira vez que a Galeria Anne Barrault acolhe uma exposição a solo de Eurídice Zaituna Kala, depois de ter apresentado uma obra dela no Jardim das Tulherias, na FIAC Hors Les Murs, em 2021.

É verdade que a obra dela tem uma vertente de denúncia, mas é mais do que isso. Nesta exposição vemos – e é bastante impressionante –várias camadas e há um lado pictórico muito presente. Ou seja, podemos abordar o trabalho dela de diferentes maneiras. Claro que ela fala das suas origens, da colonização, mas não fala só sobre isso. Por isso é tão interessante este trabalho na cidade de Nova Iorque, que não é a cidade onde ela cresceu, mas ela cria elos com a sua própria história, com Moçambique que também foi colonizado e com a América que é também um território que foi colonizado. Estes paralelos são apaixonantes e permitem olhar para o seu trabalho sob diferentes ângulos”, descreveu Anne Barrault à RFI.

No âmbito desta exposição, inaugurada a 31 de Agosto e que decorre até 5 de Outubro, Eurídice Zaituna Kala teve "carta branca" do Cinema L'Archipel em Paris para apresentar um filme a 3 de Setembro e escolheu "AI: African Intelligence" de Manthia Diawara.

Actualmente, a artista participa na exposição "Passengers in Transit" à margem da Bienal de Veneza (até 24 de Novembro de 2024).

Em 2025, Eurídice Zaituna Kala vai apresentar o seu trabalho no Centro de Arte Contemporâneo de Rennes (La Criée) de 7 de Fevereiro a 27 de Abril e vai também ter uma exposição na Ferme du Buisson, em Noisiel, de 15 de Março a 13 de Julho.

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A artista moçambicana Eurídice Zaituna Kala desconstrói a imagem de Nova Iorque e até do “sonho americano” numa exposição patente na Galeria Anne Barrault, em Paris. As fotografias montadas em estruturas de vidro e metal mostram ausências, desigualdades, relações de poder entre os homens e entre estes e a natureza. Eurídice Zaituna Kala mostra como a arquitectura é mais uma ferramenta de implementação de disparidades sociais e como a cidade vai tapando as camadas do seu próprio passado.

A exposição "En quelques gestes : as if two suns were setting", patente até 5 de Outubro, é constituída por obras realizadas durante uma residência em Nova Iorque e questiona o peso que a arquitectura urbana tem sobre a natureza e sobre as próprias pessoas.

“Quando propus um projecto de pesquisa para ir a Nova Iorque, era para olhar para a arquitectura. Para olhar como a arquitectura, de uma forma violenta, ocupa o espaço natural e cria uma sensação de betão (...) Eu queria desconstruir essa noção e, ao mesmo tempo, olhar para os arquivos: como é que a cidade foi ocupada na época pré-colonial, no pós-guerra, no pós-Segunda Guerra Mundial, que tipos de arquitectura chegaram. E como eu tenho, na materialidade do meu trabalho, materiais como o metal e o vidro, era claro que eu queria entrar também nessa noção de como esses materiais interagem com a cidade. Quais são as janelas que esses materiais criam? Quais são os ecrãs que eles criam? Como é que esses objectos obstruem a possibilidade de comunicar uns com os outros? Em Nova Iorque, tu passas em frente a um prédio e tens a sensação que não podes interagir com as pessoas que estão no interior. Quer dizer, a interioridade é completamente coberta, submersa, a partir desses materiais”, descreve a artista.

Continuando as suas pesquisas em torno dos arquivos, a artista moçambicana estudou as raízes da cidade, originalmente habitada pelo povo autóctone Lenapes e desenhada com várias colinas e rios, hoje substituídos por arranha-céus. “Havia uma natureza, uma fauna ou uma flora que esteve lá antes de uma colonização violenta que mudou completamente a topografia da cidade”, recorda. Por outro lado, ela interessou-se pela relação entre Nova Iorque e a água, um elemento que outrora dominava a paisagem e que passou a ser dominado pelas ambições arquitectónicas.

“Chegar a Nova Iorque e falar em água é quase impossível. Nós imaginamos sempre uma cidade de betão, tudo coberto, tudo numa submersão, socialmente falando, uma submersão humana, densa. Mas a história topográfica de Nova Iorque é completamente oposta a essas paisagens que nós temos do nosso imaginário. Nessa oposição, tem a água que foi coberta pela arquitectura num plano de urbanização do Robert Moses, que veio obstruir essas fontes de água que atravessavam Manhattan, Brooklyn, Bronx para criar espaços de construção”, acrescenta.

Eurídice Zaituna Kala também explorou o conceito da arquitectura contemporânea como “soft power”, em que os arranha-céus luxuosos olham de cima para os prédios sociais, os quais são reservados aos pobres e sujeitos à subida das águas durante as inundações.

“Isso foi também um dos contextos que me interessava muito compreender. Eu tive a oportunidade de subir ao andar 86 de uma torre e de viver essa experiência. Foi super estranho porque são espaços que são vendidos muito caros e que representam um contexto de arquitectura, mas, ao mesmo tempo, representam um contexto de consumo espacial, um contexto de movimento, de liquidez de espaço. Quis compreender o que quer dizer essa disparidade entre esses prédios que hoje em dia são vendidos muito caros e os prédios sociais porque Nova Iorque é uma cidade de prédios, sempre teve uma relação com a verticalidade. Os prédios sociais que foram construídos para as famílias menos ricas são também arranha-céus, mas criaram uma completa desconexão entre gerações de famílias que não puderam entrar em relação, que causaram questões sociais complexas, criminalidade, uso de drogas, etc, etc. Quer dizer, esses dois contextos propõem duas formas de criar sociedade”, continua.

Outra linha de força da exposição são as ausências, figuradas por vidros sem imagens ou pelo simbólico capuz vazio de uma camisola encontrada numa rua qualquer. Esta é também uma homenagem ao jovem negro assassinado Trayvon Martin, ao movimento Black Lives Matter e ao artista David Hammons.

Há, ainda, uma imagem criada por Inteligência Artificial que ilustra os próprios limites da tecnologia, ainda que crie uma nova camada que tende para a abstração pictórica e fotográfica. Eurídice Zaituna Kala recolheu textos inscritos em monumentos de Nova Iorque a prestarem homenagem ao povo autóctone que, outrora, viveu naquela zona e pediu à Inteligência Artificial para criar imagens. O resultado são duas imagens sobrepostas, em que se percebe uma paisagem verde luxuriante e vários espectros pálidos.

Na segunda sala, há fotografias em tons azulados que remetem, mais uma vez, para o universo da água, mas também para o imaginário cinematográfico de Nova Iorque. A artista conta-nos que se inspirou nos tons do filme “La Nuit Américaine” de François Truffaut para mostrar que a sensação de se estar numa "cidade que não dorme" pode ser esgotante e uma metáfora de que o “sonho americano” é impossível.

“Tem uma certa referência a “La Nuit Américaine”, que é este filtro usado no cinema que projecta uma sensação de noite, uma sensação de estar no exterior, de uma continuidade do dia. Eu acho que Nova Iorque tem essa forma de se querer projectar como algo que não acaba, como um dia que não acaba. Há também a questão do conceito americano que fala do sonho americano porque se o dia não acaba e se não podemos descansar, quer dizer que não temos tempo para sonhar! Ou seja, o fim desse sonho americano é mesmo uma consciência de como vivemos nestas cidades”, conclui.

É a primeira vez que a Galeria Anne Barrault acolhe uma exposição a solo de Eurídice Zaituna Kala, depois de ter apresentado uma obra dela no Jardim das Tulherias, na FIAC Hors Les Murs, em 2021.

É verdade que a obra dela tem uma vertente de denúncia, mas é mais do que isso. Nesta exposição vemos – e é bastante impressionante –várias camadas e há um lado pictórico muito presente. Ou seja, podemos abordar o trabalho dela de diferentes maneiras. Claro que ela fala das suas origens, da colonização, mas não fala só sobre isso. Por isso é tão interessante este trabalho na cidade de Nova Iorque, que não é a cidade onde ela cresceu, mas ela cria elos com a sua própria história, com Moçambique que também foi colonizado e com a América que é também um território que foi colonizado. Estes paralelos são apaixonantes e permitem olhar para o seu trabalho sob diferentes ângulos”, descreveu Anne Barrault à RFI.

No âmbito desta exposição, inaugurada a 31 de Agosto e que decorre até 5 de Outubro, Eurídice Zaituna Kala teve "carta branca" do Cinema L'Archipel em Paris para apresentar um filme a 3 de Setembro e escolheu "AI: African Intelligence" de Manthia Diawara.

Actualmente, a artista participa na exposição "Passengers in Transit" à margem da Bienal de Veneza (até 24 de Novembro de 2024).

Em 2025, Eurídice Zaituna Kala vai apresentar o seu trabalho no Centro de Arte Contemporâneo de Rennes (La Criée) de 7 de Fevereiro a 27 de Abril e vai também ter uma exposição na Ferme du Buisson, em Noisiel, de 15 de Março a 13 de Julho.

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